Mapas mentais, "pensamento vírus" e saúde

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qua, 19/01/2005

Há 18 anos atrás, em janeiro de 1978, minha mãe, Patrícia Dilts, teve seu primeiro diagnóstico de câncer de seio. Ela foi tratada cirurgicamente com uma mastectomia radical, na qual seu seio, alguns nódulos linfáticos e outros tecidos foram removidos. Embora a operação a desfigurasse, seus médicos lhe disseram que esta era a melhor maneira de tratar a doença e que eles estavam certos de assim eliminarem o câncer.

Quatro anos mais tarde, ela teve uma recorrência de tumores no outro seio e ovários. uma pesquisa em seus ossos mostrou um amplo grau de metástase praticamente em cada um dos ossos de seu corpo. Os médicos disseram que estavam errados sobre terem eliminado o câncer e, devido ao estado avançado da doença, provavelmente não havia muito mais que eles pudessem fazer por ela. Ela não deveria sobreviver por muito tempo.

Pela sua própria coragem, abertura à autoexploração e amor à vida e à sua família, minha mãe encarregou-se de sua própria saúde e teve uma recuperação excepcional. Durante mais de doze anos ela continuou a manter sua saúde, permanecendo livre dos sintomas a maioria do tempo e apresentando uma extraordinária habilidade para sair de qualquer desafio físico. A história de seu processo de recuperação é constantemente contada por mim nos meus seminários, conferências e em meus livros - "Crenças: Caminhos para a Saúde e Bem Estar" e "Mudando os Sistema de Crenças com PNL". Seu compromisso com a vida e com sua família tem sido uma inspiração para várias pessoas no mundo inteiro, as quais procuram encontrar suas próprias trilhas para a integração e congruência.

Em 3 de dezembro de 1995, minha mãe morreu após muitos anos de bem estar. Ela vinha apresentando dificuldades com sua saúde há alguns meses e consentiu em fazer algumas sessões de quimioterapia e radioterapia recomendadas por seus médicos. Infelizmente, estes tratamentos de quase nada adiantaram e foram muito fortes para seu corpo. Eles acabaram por contribuir para a desintegração de sua condição física e terminaram por levá-la à morte. De uma certa forma era como se ela tivesse tomado uma decisão radical, tornando-se insensível a sugestões e intervenções que tinham sido efetivas no passado. Embora eu esteja naturalmente triste e confuso sobre porque sua morte deu-se desta vez, eu devo aceitar sua própria explicação de que ela tinha terminado o que precisava fazer e estava pronta para se reunir a meu pai (que tinha falecido há 10 anos).

Durante todo seu desafio à doença, minha mãe manteve a coragem e a dignidade até o fim e morreu cercada por sua família e à luz de um profundo amor. E embora em seus últimos dias houvessem ocasiões muito dolorosas, houveram momentos de grande beleza, felicidade e inspiração.

Embora eu não tivesse inicialmente a intenção de escrever este artigo com este propósito, eu considero este artigo um tributo à minha mãe e a muitos dos profundos ensinamentos que dela recebi através dos anos.

Milton H. EricksonMilton Erickson, por Robert Dilts

Uma das mais fundamentais pressuposições da PNL é que "o mapa não é o território". Como seres humanos conhecemos inicialmente a realidade através dos nossos sentidos, os quais são limitados. Por exemplo, cachorros ouvem coisas que nós não conseguimos ouvir. Abelhas veem luz infravermelha que nós não temos capacidade de enxergar. Nossos sentidos são limitados, e ainda assim é só o que temos para lidar com este mundo. Nós respondemos aos mapas mentais baseados em nossas percepções sensoriais da realidade, em vez da realidade propriamente dita. São nossos mapas "neurolinguísticos" da realidade que determinam como nos comportamos e isto dá significado àqueles comportamentos, e não a realidade propriamente dita. Quando as pessoas pensavam que a terra era chata, elas nem sequer consideravam dar a volta em torno dela. Portanto é seguidamente nosso mapa do mundo, mais do que o mundo propriamente dito, que nos limita ou inversamente nos fortalece.

Os mapas das pessoas são diferentes dependendo de suas origens, do seu meio social, de sua cultura , de seu treinamento profissional e de sua história pessoal. Uma grande parte da PNL é sobre como lidar com o fato das pessoas terem diferentes mapas do mundo. As pessoas têm crenças diferentes sobre a capacidade do corpo para a cura e sobre o que "deve ser feito" e o que "pode ser feito" em relação a sua própria cura.

Uma das coisas que aprendi através do trabalho na área da saúde é que as pessoas têm mapas sobre o que é possível em relação à cura física e o que é a cura, e elas vivem de acordo com estes mapas. As vezes estes mapas podem ser muito limitantes.

Por exemplo, as vezes, as pessoas falam sobre sintomas físicos como os do câncer e da AIDS como se elas fossem "possuídas" por estes sintomas. Até mesmo médicos falam sobre estes sintomas como se eles tivessem qualidades como inteligência e vontade própria. As pessoas dizem que o câncer "invade" o corpo e falam sobre como o vírus da AIDS "engana" o sistema imunológico e "usa" o corpo das pessoas. Eu tenho ouvido oncologistas falarem como o câncer de seio de diferentes pessoas "têm sua própria personalidade". Alguns são mais "agressivos", alguns são mais "vagarosos". Fala-se assim como se estas características fossem inerentes ao sintoma.

Com relação à longa remissão da metástase do câncer de seio de minha mãe, por exemplo, um dos seus oncologistas comentou: "..mas seu câncer comportou-se de uma maneira muito amistosa.". Em vez de pensar que a personalidade ou a habilidade de cura da pessoa afeta o sintoma, é percebido como se o corpo da pessoa fosse completamente passivo e torne-se possuído pelos sintomas com diferentes personalidades.

Após ouvir seu oncologista explicar que a razão pela qual a quimioterapia não tinha curado o câncer era porque o câncer descobrira uma maneira de escapar dos remédios, minha mãe gracejou: "Eles falam destas células como se uma célula individual tivesse mais inteligência do que um rato de laboratório.

Estes tipos de mapas e crenças determinam como abordamos o processo de cura destes sintomas. Se algo é percebido como um invasor externo com inteligência e intenção negativa, por exemplo, nós sentimos que ele deve ser fisicamente atacado e destruído.

Quando minha mãe descobriu que estava com metástase e começou a explorar o que ela poderia fazer mentalmente para auxiliá-la a promover sua autocura, seu cirurgião disse-lhe que "toda essa coisa de cura corpo e mente era puro papo furado" que ia deixá-la "louca".

Este tipo de crença, especialmente se for apresentado como "o mapa certo do mundo" pode se tornar o que eu chamo de "pensamento vírus". Um "pensamento vírus" é essencialmente uma crença limitante que interfere com o esforço próprio ou de outros na cura ou na melhora.

Nesta época, por exemplo, minha mãe estava trabalhando como enfermeira de um clínico geral. Ao invés de dizer-lhe que ela estava sendo tola, como fizera o seu cirurgião, o médico que era seu empregador, levou-a para um lado e disse-lhe: "Olhe Pat, se você realmente se importa com sua família, você não os deixará despreparados". Embora esta assertiva fosse menos declaradamente confrontadora do que a do seu cirurgião, era na realidade um pensamento vírus mais potente do que dizer diretamente "isto é um monte de papo furado".

Porque uma grande parte da mensagem está implícita e não declarada, é mais difícil reconhecer que "Isto é apenas sua opinião". Você pensa, "Sim, eu me importo com minha família. Não, eu não quero deixá-los despreparados". Mas o que não está declarado, não está na superfície, é que "deixá-los" significa "morrer". A pressuposição da declaração é que "você vai morrer". E a implicação da declaração era que ela deveria "parar com esta tolice e aprontar-se para morrer", ou ficaria mais difícil para sua família. Se você realmente se importa com sua família, você não continuará tentando melhorar, porque você justamente vai deixá-los despreparados.

O que faz com que isto seja muito mais do que um pensamento vírus em potencial é que implica em que o modo certo e único de ser uma amorável e boa mãe e esposa é aceitar que você vai morrer e preparar a si e a sua família para aquela inevitabilidade. Sugere que tentar recuperar a própria saúde, quando a morte é tão iminente, é essencialmente ser egoísta e não se importar com a sua família. Isto criaria apenas uma falsa esperança, potencialmente sugaria recursos financeiros e levaria à tristeza e ao desapontamento.

Tais "pensamento vírus" podem "infectar"a mente das pessoas e seu sistema nervoso tanto quanto um vírus físico pode infectar o corpo ou um vírus de computador pode infectar um sistema de computação, levando à confusão e mau funcionamento. Assim como a programação de um computador, ou todo um sistema de computadores pode ser danificado por um vírus de computador, nosso sistema nervoso pode ser capaz de ser infectado e danificado pelo "pensamento vírus".

Biologicamente, um vírus é na realidade um pequeno pedaço de material genético. Nosso código genético é o "programa físico" do nosso corpo. Um vírus é uma parte incompleta do "programa". Não é algo realmente vivo. Esta é a razão pela qual você não pode matar um vírus. Você não pode matá-lo ou envenená-lo porque ele não está vivo.(1) Ele entra na célula de seu hospedeiro, o qual, se não estiver imune ao vírus, involuntariamente, oferece-lhe um "lar" e até o ajuda a reproduzir e fabricar mais vírus.

Um vírus de computador é semelhante a um vírus biológico no sentido de que não é um programa completo e inteiro. Não tem "conhecimento" do local ao qual pertence no computador, ou quais os locais de memória seguros ou abertos para ele e não tem noção da "ecologia do computador". Não tem percepção de sua identidade com respeito ao resto da programação do computador. Seu propósito primeiro é simplesmente continuar a se reproduzir, multiplicando-se.

Porque ele não reconhece ou respeita as fronteiras de outros programas e dados no computador, ele reescreve indiscriminadamente, apagando-os e substituindo-os por si mesmo. Isto causa mau funcionamento do computador que comete sérios erros.

Para mim, um pensamento vírus é similar a estes outros tipos de vírus. Não é uma ideia completa, coerente que se harmonize e organicamente suporte um amplo sistema de ideias e crenças de uma pessoa numa forma saudável. É um pensamento ou crença em particular que pode criar confusão ou conflito. Pensamentos e crenças individuais não têm nenhum poder próprios. Eles só conseguem "vida" quando alguém age sobre eles. Se uma pessoa decide "desempenhar" o papel de uma crença" ou agir de acordo com um pensamento em particular, esta pessoa pode tornar "viva" esta crença, esta crença pode tornar-se autorrealizável.

Como um exemplo do que quero dizer, minha mãe viveu mais de 12 anos além do que os médicos predisseram, principalmente porque ela não acreditou em algumas das crenças deles. O médico para o qual ela trabalhava, disse-lhe que se ela tivesse sorte, ela poderia viver 2 anos, e quando falou comigo, falou em termos de meses e até semanas. Ela parou de trabalhar para ele e viveu muitos anos mais, inteiramente livre de quaisquer sintomas de câncer

Alguns anos depois de minha mãe deixar de trabalhar para ele, este mesmo médico ficou seriamente doente (embora sua doença não estivesse nem remotamente tão adiantada como a da minha mãe). A resposta dele a esta situação foi suicídio. Mais ainda, ou ele convenceu sua esposa a suicidar-se também, ou talvez levou-a consigo sem o consentimento dela (a situação nunca ficou completamente esclarecida). Porque? Porque ele acreditava que sua morte era iminente e inevitável e não queria deixá-la "despreparada".

O ponto é que um pensamento vírus pode levar à morte tão rapidamente quanto um vírus de AIDS. Ele pode matar seu "hospedeiro" tão facilmente quanto ele pode ferir outros que se tornam "infectados" pelo hospedeiro. Pense em quantas pessoas morreram por causa da "limpeza étnica" e das "guerras santas". Até pode ser que muito da maneira que um vírus de AIDS mata é através do pensamento vírus que o acompanha.

Eu quero deixar bem claro que não estou sugerindo que o médico de minha mãe era de alguma forma uma má pessoa. Eu acredito que ele fosse um bom médico e um homem íntegro. O problema não era ele. Era a crença, o "vírus". Na realidade o fato de que ele tenha tirado sua própria vida pode ser visto como um ato definitivo de integridade - caso alguém tenha sua crença. São as crenças que precisam ser julgadas criticamente, não as pessoas.

Um pensamento vírus não pode ser morto, pode ser apenas reconhecido, neutralizado, expulso do resto do sistema. Você não pode matar uma "ideia" ou "crença" porque ela não é viva. E matando a pessoa que age na base de uma ideia ou crença também não mata a ideia ou crença.

Séculos de guerras e perseguições religiosas têm demonstrado isso. (A quimioterapia trabalha de uma forma semelhante à da guerra; mata células infectadas, mas não cura o corpo nem o protege contra o vírus - e infelizmente ela inflige um número relativamente alto de "baixas civis" nas células saudáveis do corpo).

Crenças limitantes e pensamento vírus devem lidar com o corpo de forma semelhante à maneira como o corpo lida com o vírus físico ou um computador lida com um vírus de computador - reconhecendo-o, tornando-se imune a ele e não lhe dando lugar no seu sistema.

NOTA: 1 - Isto em contraste com "bactérias" que são de fato células vivas. Bactérias podem ser mortas, por exemplo, por antibióticos. Mas antibióticos são inúteis contra vírus. Porque as bactérias são células contidas, elas não" invadem " ou conquistam nossas células corporais. Algumas são parasitas e podem ser danosas se forem em grande quantidade. Mas muitas bactérias são úteis e de fato o corpo as necessita - para digerir a comida, por exemplo.

ROBERT DILTS é um semeador de ideias e tem contribuído para os conceitos e pressuposições da PNL, incluindo o desenvolvimento básico em áreas de estratégias cognitivas, sistema de crenças e princípios do que veio a ser conhecido como sistematização da PNL. Ele escreveu muitos livros clássicos sobre PNL, incluindo o último Aprendizagem Dinâmica, com Todd Epstein. Muito bom desenhista de retratos também.

Tradução: Evanice L. Pauletti
Revisão: M. Helena Lorentz
Publicado na Anchor Point de março de 1996
Artigo publicado no Golfinho Impresso Nº19 de maio/1996

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