Ajudando uma Criança Violenta – estudo de um caso

Naomi Drew, M.A.

PAZ Sean era uma criança que me ensinou mais sobre o gerenciamento da raiva do que qualquer curso que eu tenha feito ou livro que tenha lido. Eu encontrei Sean cerca de 15 anos atrás, pouco depois do lançamento do meu primeiro livro "Learning the Skills of Peacemaking", em português A Paz Também se Aprende. Sean era meu estudante. Tinha 7 anos de idade e era uma criança muito interessante – esperto, perceptivo, articulado, mas também tinha um temperamento explosivo. Sean ficava completamente fora de si quando alguma coisa provocava sua raiva. Nenhuma das soluções usuais funcionava com ele – as consequências, o sistema de recompensa, telefonema para casa, tempo livre; quando botava para fora sua raiva impulsiva, cuidado.

Tudo isso atingiu o ponto culminante no dia que encontrei o Sean no pátio com uma outra criança estendida no chão, e ele, segurando firme a cabeça da criança, pronto para arrebentar a cara dela no pavimento. Com o coração na boca, eu corri para o Sean e gritei para ele parar. O choque ao ouvir a minha voz e a minha presença ao seu lado, o fez deixar a criança antes que algum dano fosse feito. Eu tive medo que, numa próxima vez, isso fosse diferente.

Eu mandei o Sean para a sala da diretora onde foi repreendido e a sua mãe chamada para uma reunião, mas eu sabia que só essas providências não iam resolver o problema. Tive a ideia de sentar com Sean e ver se eu podia entrar na sua cabeça. Alguma coisa me dizia que suas próprias palavras poderiam me dar uma pista para a solução. Minha intuição se mostrou correta.

ND: Antes de qualquer coisa Sean, você precisa saber que machucar outra pessoa é absolutamente inaceitável, não importa quão furioso você esteja.

Sean: (abaixando sua cabeça) Eu sei. Minha mãe sempre diz isso.

ND: Então porque você continua a fazer? Você se dá conta de que se fosse adulto e fizesse o que estava pretendendo, você poderia ser preso? Isso é uma tentativa de agressão.

Sean: Eu não consigo evitar. Eu fico muito brabo.

ND: O que acontece dentro de você quando fica tão brabo?

Sean: O que você quer dizer?

ND: Como você se sente quando começa a perder a calma?

Sean: (pensando com empenho) Bem, é como se eu tivesse essa energia que quer sair e eu não consigo controlá-la...

Neste ponto, ele ficou indeciso e olhou para o chão como se tivesse mais para dizer, mas não estava seguro se devia.

ND: O que mais?

Sean: Eu não posso falar sobre isso. Eu estou muito envergonhado.

ND: Olhe Sean, eu quero te ajudar. Se você for sincero comigo, talvez nós podemos encontrar uma maneira para você lidar com esse problema.

Sean: (olhando para baixo de novo) Alguma coisa muito ruim acontece dentro de mim quando eu fico brabo.

ND: O quê?

Ele começou a se debater num conflito – com o olhar distante, mordendo os lábios, se contorcendo na cadeira. Finalmente ele continuou -

Sean: É como se eu tivesse duas partes – a parte boa que sabe fazer a coisa certa e … a outra parte.

ND: (tocando no seu ombro) Me fale sobre a outra parte.

Ele contorceu seu rosto.

ND: Tudo bem Sean. Só me diga . . .

Sean: É como a minha mãe me contou sobre o diabo. É como se um diabo dentro de mim tomasse conta, e apesar de que eu sei o que devo fazer, eu não consigo.

Ele começou a chorar. Eu estava assombrada pelo modo como essa criança de sete anos era capaz de articular as suas sensações. Ele estava completamente consciente dessa dicotomia na qual vivia, e isso o estava atormentando.

ND: Então você sente que, quando essa sua parte assume, você não consegue se controlar.

Sean: (ainda chorando) Certo.

ND: É ótimo que você seja capaz de reconhecer o que está acontecendo dentro de você. Muitos adultos não conseguem fazer isto. Você acabou de dar o primeiro passo para conseguir uma solução para esse problema.

Sean: Verdade?

ND: De verdade. Todos nós ficamos brabos, Sean. Todos nós temos essa parte obscura dentro de nós que quer fazer coisas erradas. É parte do ser humano. Mas nós não precisamos colocar em prática os pensamentos que temos. Nós podemos fazer outra escolha.

Sean: Como?

ND: Têm uma série de coisas que você pode fazer para conseguir se controlar quando se sentir furioso e é nisso que eu vou lhe ajudar. Primeiro, me diga: o que acontece no seu corpo quando você fica realmente brabo como ficou hoje.

Sean: O que você quer dizer com - no meu corpo?

ND: Bom, quando eu fico braba, o meu coração bate mais ligeiro e a minha boca fica seca.

Sean: (se concentrando de novo) Acho que eu sinto calor no meu rosto e sinto que as minhas mãos fazem assim (ele juntou as duas mãos como se fosse esganar alguém).

ND: Isso é ótimo Sean. Já sabendo dessas coisas, vai ajudar.

Sean: Mas como? Eu ainda sinto que vou fazer coisas ruins quando fico brabo.

ND: Você pode sentir como se fizesse coisas ruins, mas você não tem que agir com a sensação. Existe algo que você pode fazer em vez disso, pelo menos quando você estiver na escola.

Sean: O quê?

ND: Você pode me procurar. No minuto que você sentir que o seu rosto começa a esquentar, suas mãos se agarrando e aparecer aquela energia sobre a qual você me falou antes, diga firmemente para você "Pare!" Levante um grande sinal vermelho de Pare na sua cabeça. Então corra para mim tão rápido quanto puder e me diga o que estava acontecendo. Eu prometo, eu vou parar qualquer coisa que estiver fazendo para ajudá-lo.

Sean: Mas, e se você estiver ocupada com outra criança?

ND: Venha até mim de qualquer maneira.

Sean: E você não vai ficar braba?

ND: Pelo contrário. Vou ficar contente.

Sean: (intrigado) Porquê?

ND: Por que você parando e vindo a mim é uma escolha muito melhor do que machucar alguém.

Sean: Mas eu pensei que nós íamos conversar sobre as coisas que acontecem quando a gente está braba.

ND: Isso é mais tarde, Sean. Agora, vamos só trabalhar em lhe ajudar a não machucar ninguém. Uma vez nós tenhamos tratado disso, depois vamos conversar.

Sean: (com o olhar perplexo) Estou com medo de que isso não vá funcionar.

ND: Por que não?

Sean: E se você não estiver lá?

ND: Eu vou falar com as auxiliares do intervalo e providenciar para que você vá falar com uma delas.

Sean: Mas pode ser que elas me castiguem.

ND: Somente se você machucar alguém. Eu lhe prometo, elas não vão ficar brabas se você pedir ajuda.

Sean: Como eu vou me lembrar disso quando eu ficar realmente brabo?

ND: Nós vamos praticar isso agora.

Nós fizemos uma relação das situações que faziam Sean ficar brabo – crianças passando na sua frente na fila, alguém lhe tirando a bola, sendo provocado por alguém. Começamos simulando essas situações – eu bancando a outra criança e Sean bancando ele mesmo. Depois trocamos os papéis, pois assim Sean podia sentir como era estar no lugar de quem recebia a raiva dele. Pela primeira vez ele se deu conta de como a sua raiva era aterradora para a outra criança.

Depois disso, nós simulamos as mesmas situações com "o novo caminho," com Sean dizendo a si mesmo "PARE" quando ficava furioso, me procurando, e depois respirando profundamente até que ele se sentisse mais calmo. Ensinei ao Sean como fazer respiração abdominal, fazendo uma profunda respiração pelo nariz, expandindo seu abdômen, segurando a respiração por um momento e então deixando o ar sair lentamente pela boca. Praticamos isso algumas vezes até parecer que Sean havia aprendido.

Nossa próxima etapa era pôr isso a prova no mundo real. Conversei com a mãe dele e contei sobre o nosso plano. Ela, agradecida, concordou em fazer a mesma coisa em casa. Agora Sean tinha um amplo sistema de suporte – em casa, na escola e no playground.

Todas as manhãs, eu relembrava Sean do plano que nós havíamos traçado, e como eu estava orgulhosa dele estar disposto a testá-lo. Alguns dias depois nós enfrentamos nosso primeiro teste. Sean ficou enraivecido quando outra criança tentou tirar a bola dele num jogo de futebol. Ele começou a se jogar contra a criança, quando se lembrou do que nós tínhamos praticado. Ao invés de bater em alguém, ele correu para mim com o rosto todo vermelho e disse "eu senti como se fosse bater nele!"

Colocando minhas mãos no seu ombro e olhando direto nos seus olhos, eu disse "em vez disso, você me procurou. Ótimo. Agora vamos fazer algumas respirações profundas." Juntos nós respiramos, e assim Sean começou a recuperar sua calma.

"Você fez uma boa escolha, Sean. Estou orgulhosa de você. Como você se sente agora?"

"Eu não pensei que eu poderia fazer isso," ele disse, ensaiando um sorriso.

"Mas você fez," eu disse, "e agora você sabe que isso é realmente possível. Isso é exatamente o que você deve fazer da próxima vez. Se eu não estiver aqui, vá até a Sra. Sarma. E se você estiver em casa, vá até a sua mãe. Feito?"

"Feito," disse Sean, seus olhos brilhando.

Vagarosamente e com firmeza, Sean se controlou para conseguir manter sua raiva sob controle. Eu continuamente o elogio pelo seu crescente domínio sobre a raiva. Em poucos meses, ele realmente venceu a crise, vendo que quando se afastava da origem da raiva, ele podia recuperar o controle e quando o fazia, se sentia melhor com ele mesmo.

No final das contas, Sean descobriu que era realmente possível tratar de um problema sem que ninguém ficasse machucado. O rumo da sua vida mudou ao aprender isso. O mesmo pode ser verdadeiro para qualquer criança cuja raiva aparenta estar fora de controle. Experimentando em seu próprio filho as técnicas que eu usei com Sean, irá ajudá-lo a aprender maneiras de recuperar o controle perante a sua própria raiva.

Naomi Drew é reconhecida em todo o mundo como uma especialista na resolução de conflitos e em técnicas de pacificação. Saudada como visionária, seu trabalho permitiu que educadores, pais e pessoas de todas as idades vivam juntas com mais cooperação.

Seu trabalho tem sido reconhecido por lideres educacionais de todo o país. Pessoas de todas as idades tem atestado mudanças permanentes em seus relacionamentos depois da aplicação dos princípios que Drew ensina. Seu trabalho já apareceu com destaque em revistas, jornais, rádio e na TV e, atualmente, atua como especialista em cuidados paternais no show de televisão "Classroom Close-ups."

Autora de quatro livros, trabalha como consultora de distritos escolares e conduz seminários e cursos para pais. Seu ultimo livro é Hope and Healing: Peaceful Parenting in an Uncertain World.
Visite www.learningpeace.com para mais informações sobre Naomi Drew e seu trabalho.
Artigo original: Helping a Violent Child - A Case Study

Livro traduzido para o português, temos: A Paz Também se Aprende   Diversos exemplares na Estante Virtual